Por que o céu é azul? Por que o pôr do sol é avermelhado? Se você é mais ligado em ciência, pode responder “por causa do espalhamento da luz nas moléculas de oxigênio”, é claro.
O fenômeno do espalhamento ocorre quando há um desvio, ou alteração do caminho, de uma forma de energia (radiação eletromagnética, partículas, ou até mesmo o som). Nessa matéria, especificamente, falaremos sobre dois fenômenos parecidos: o espalhamento de Rayleigh e o espalhamento de Mie.
Mas antes, precisaremos recapitular brevemente o conceito de comprimento de onda das ondas eletromagnéticas.
O comprimento de onda da luz
Toda onda eletromagnética tem um comprimento de onda. Um comprimento de onda é, resumidamente, a distância de uma “crista” da onda até a outra.
Isso faz toda a diferença no estudo do comportamento das ondas eletromagnéticas. Radiação com curtos comprimentos de onda carrega mais energia e podem quebrar moléculas, a chamada radiação ionizante; longos comprimentos de onda, como rádio e micro-ondas, podem atravessar paredes sólidas; e fótons de diferentes comprimentos de onda se espalham de forma diferente ao encontrar partículas de diferentes tamanhos (grãos de poeira, fumaça ou átomos).
Espalhamento de Rayleigh
O espalhamento de Rayleigh, ou dispersão de Rayleigh, ocorre quando o diâmetro da partícula é muito menor do que o comprimento de onda do fóton que a atinge.
O céu azul é um exemplo do espalhamento de Rayleigh. Quando os fótons da luz do Sol se propagam, eles colidem com vários átomos e moléculas gasosas presentes no ar. No momento da colisão, o fóton é absorvido por essa partícula, fazendo seus elétrons vibrarem. A vibração dos elétrons é, então, reemitida na forma de radiação eletromagnética para todas as direções. Esse fenômeno é o espalhamento de Rayleigh.

Ele ocorre devido à polarizabilidade elétrica das partículas e às oscilações do campo elétrico. Essas oscilações do fóton atuam em partículas com carga elétrica (como um elétron), fazendo-as se moverem na mesma frequência, transformando-as em um dipolo radiante — emissão que percebemos como luz.
A intensidade da luz espalhada é inversamente proporcional à quarta potência do comprimento de onda ($I \propto 1/\lambda^4$), e é por isso que comprimentos de onda mais curtos (como a luz azul) são espalhados mais fortemente do que comprimentos de onda mais longos (luz vermelha).

Ao atravessar uma longa camada de atmosfera, o espalhamento de Rayleigh vai se acumulando, espalhando mais e mais luz azul, fazendo “sobrar” luz vermelha. É por isso que o pôr-do-sol tem cor que varia do vermelho ao alaranjado.
Acontece que a composição da atmosfera da Terra também propicia esse fenômeno. As moléculas de nitrogênio e oxigênio têm fortes ressonâncias próximo do ultravioleta. A atmosfera rica em hidrocarbonetos de Titã, lua de Saturno, propicia o espalhamento de Rayleigh na cor laranja… meio marrom…
Espalhamento de Mie
O espalhamento de Mie acontece com partículas iguais ou maiores do que o comprimento de onda da luz que as atinge. Esse tipo de espalhamento é o mais comum em nuvens e névoas, com partículas de vapor d’água, ou poeira. Ao contrário do espalhamento de Rayleigh, que emite luz com a mesma intensidade para todos os lados, o espalhamento de Mie tem maior intensidade na mesma direção da luz incidente.
O espalhamento de Mie ocorre por um mecanismo físico um pouco mais complicado do que o espalhamento de Rayleigh, mas vou buscar entrar nos conceitos da forma mais fácil possível.

No início do século XX, Gustav Mie estava se perguntando o motivo pelo qual uma solução de nanopartículas de ouro (ou sistema coloidal) aparentava de cor diferente conforme o tamanho dessa nanopartícula. Essa cor dependia do tamanho da partícula, do seu formato, concentração, mas as cores podiam ir do vermelho, azul, preto, até se tornar praticamente transparente.
Tendo como base as equações de Maxwell para o eletromagnetismo, em 1908 Mie publicou seu artigo “Contribuições para a óptica do meio turvo, particularmente soluções metálicas coloidais” com suas complexas equações relacionando como a absorção da luz e o tamanho das partículas poderia influenciar na cor do espalhamento.

Em essência, ao contrário do espalhamento de Rayleigh, que transforma os elétrons em um dipolo único, o espalhamento de Mie inclui a solução completa de Maxwell, com todos os termos multipolares. Na teoria de Mie, assume-se que cada partícula é uma pequena “esfera dielétrica” que obedece às equações de Maxwell.
Ao contrário do espalhamento de Rayleigh (cuja intensidade é proporcional a $1/\lambda^4$), o espalhamento de Mie é independente do comprimento de onda, espalhando por igual todas as cores. No caso das nuvens, elas espalham quase igualmente a luz branca do Sol, dando às nuvens uma cor igualmente branca.

A solução deste problema aparentemente simples é excepcionalmente difícil. De fato, este é um dos problemas clássicos da matemática aplicada, e sua solução foi tentada (e parcialmente alcançada de várias formas) por muitas das figuras mais ilustres da física do século XIX.
Por razões históricas, Mie geralmente recebe o crédito pela primeira solução completa do problema, e sua solução das equações de Maxwell é comumente chamada de teoria de Mie. O artigo de Mie tem 69 páginas de equações densas, e duvido que mais do que um punhado de pessoas tenha realmente lido o artigo na íntegra, embora tenha sido citado em dezenas de milhares de artigos.