Hoje, sabe-se que apenas uma pequena parte do Universo é composta por matéria “normal”, como prótons, nêutrons e elétrons — que chamamos de matéria bariônica. Esses três componentes, quando unidos, formam os átomos e moléculas de todos os elementos conhecidos.
No entanto, estima-se que 69% do Universo seja feito de energia escura indetectável. Dos 31% restantes, estima-se que 26% é composto de matéria escura, também indetectável, e que apenas 5% do Universo é feito da matéria bariônica convencional.
Apesar dos nomes parecidos, matéria escura e energia escura são coisas diferentes. Mas, afinal, o que é matéria escura? E energia escura? Qual a diferença entre as duas coisas?
O que é a matéria escura?

Fritz Zwicky, estudando um gigantesco aglomerado de galáxias, inferiu a existência de “matéria escura” em 1933. Seus cálculos mostraram que a massa visível no Aglomerado de Coma era insuficiente para explicar as forças gravitacionais observadas, sugerindo a presença de massa invisível que manteria o aglomerado unido.
Observações posteriores que serviram de evidência para a existência de halos de matéria escura em galáxias estavam na medição da rotação das galáxias. Segundo a Terceira Lei de Kepler, a velocidade orbital de planetas e satélites diminui com a distância — quanto maior o raio da órbita, menor sua velocidade. Por exemplo, Mercúrio orbita o Sol mais rápido que a Terra; e a Terra orbita mais rápido que Saturno. Quando a astrônoma Vera Rubin estava tomando medições das rotações de galáxias, ela percebeu algo curioso: as estrelas orbitavam todas na mesma velocidade, em uma aparente violação das leis gravitacionais.

Como a força gravitacional está diretamente relacionada à massa de um corpo (conforme a famosa equação de Newton, $F = \frac{GmM}{r^2}$), isso significava que, para explicar a anomalia, a galáxia observada deveria ter muito mais massa do que aparentava. Essa matéria invisível, que não emite ou absorve luz, e não interage com a matéria normal, mas capaz de gerar atração gravitacional, foi chamada de “matéria escura”.

Outra evidência muito forte da existência da matéria escura está na observação de lentes gravitacionais. O efeito de lente gravitacional ocorre quando um objeto de alta massa se situa entre a fonte de luz e o observador, desviando o caminho da luz. A quantidade observada de “massa luminosa” (massa estelar) não é suficiente para produzir o efeito de lente observado. Adicionar matéria escura ao modelo permite que o efeito de lente seja reproduzido.
Por fim, a existência da matéria escura também se sustenta na observação da velocidade de dispersão das galáxias. O teorema do virial, combinado com a distribuição de velocidade, permite a medição da distribuição de massa em sistemas ligados. No entanto, a dispersão de velocidade em galáxias elípticas frequentemente se desvia das previsões baseadas em distribuições de massa observadas.
E a energia escura?
Enquanto a matéria escura tem como característica marcante seus efeitos de anomalias gravitacionais, a energia escura está relacionada a um efeito contrário: a expansão do Universo.
Em 1917, Albert Einstein teve uma ideia inteligente. Acreditando em um Universo estático, ele adicionou uma solução especial às suas equações da relatividade geral, chamada de constante cosmológica, dando a ela o símbolo Λ (lambda maiúsculo). Essa solução ajudou a neutralizar a atração da gravidade sobre a matéria comum, deixando o Universo estático — se a gravidade tivesse seu caminho livre, o Universo entraria em colapso ou se expandiria para sempre. Mas o truque de Einstein manteve as coisas em equilíbrio.
$$R_{\mu \nu }-{\tfrac {1}{2}}R\,g_{\mu \nu }+\Lambda g_{\mu \nu }=\kappa T_{\mu \nu}$$
Tudo foi por água abaixo quando Georges Lemaître e Edwin Hubble provaram o contrário: o Universo estava se expandindo. Einstein, então, renunciou sua constante cosmológica e assumiu dizendo que sua falha em prever um Universo dinâmico foi um dos maiores erros de sua carreira.

Na década de 1990 as coisas continuaram a mudar. Grupos de astrônomos (Riess et al., 1998; Perlmutter et al., 1999), estudando supernovas tipo Ia, observaram algo curioso: os desvios para o vermelho, ou redshift, dessas explosões eram muito mais intensos em supernovas mais distantes. Isso indicava que o Universo não estava apenas se expandindo, mas sua taxa de aceleração estava aumentando. No final, uma “constante cosmológica” era realmente necessária, mas não para manter o Universo estático como Einstein sugeria, mas para produzir uma expansão acelerada.
Esse tipo de energia misteriosa e invisível que produziria tal aceleração foi chamado, então, de “energia escura” por Michael Turner em 1998.
A propriedade mais importante da energia escura é que ela tem pressão negativa (ação repulsiva) e é distribuída de forma relativamente homogênea no espaço. A energia escura é explicada como uma constante cosmológica ou energia de vácuo. Adicionar essa constante cosmológica ao quadro do Universo em expansão proposto por Lemaître, Hubble & Cia. nos leva ao modelo Lambda-CDM, considerado o “Modelo Padrão” da cosmologia devido às predições precisas com as observações.
Mas esse é assunto para uma próxima matéria…